Ho Ho Ho Ha Ha Ha

A vida é uma eterna busca pelo inalcançável
Todo fim de ano é tempo de renovação
Renovar antigos compromissos jamais cumpridos
Ou só em parte
Só parte...
Por que tudo de novo sempre?
Velhos sonhos irrealizáveis
Natal tem um tanto de melancolia
Não se sabe o que comemorar ao certo
Muita CONFUSÃO
Fusão de ideias incutidas, inanimadas
Papais noéis se proliferam
E mensagens benevolentes
Amanhã passa
A uva passa
O peru, o chester, o frango, o osso
A batata, palha assada
Fogo de palha
A vela apaga
Dorme menino
Menina, menine
Com fome
Ano que vem tem mais.

Era uma Casa

A casa no asfalto não me apetece
Enquanto o coração no peito apodrece
Tudo em volta sufoca e desaparece

Paredes são muros que dividem
Esfacelam sonhos que incidem
No chão frio e branco entre/cortado

O teto não é engraçado
Para um olhar enluarado
Com pé de terra calçado

A casa no mato é cura
Silêncio que o ouvido apura
Cheiro que o peito atura
Gosto da fruta pura!

A casa no asfalto não compreende
Apaga as memórias, repreende
A arte, a fuga do medo que acende.

Trevo em Flor

Tem hora que sinto o perfume
Me vejo olhando sua foto
Tentando encontrar na essência
Te vejo sem perder o foco

Tem hora que o cheiro é teimoso
Invade sem deixar escolha
O aroma em mim é intenso
De mato, bicho, flor e folha

Tem hora e nem sei o porquê
Me vejo a brilhar em sua alma
Seu cheiro em mim é profundo
Procuro sentir, mas com calma

Porque o tempo há muito me intriga
Responde, ensina, trabalha
Dá jeito de achar um caminho
Do amor se encontrar, nunca falha.

Insônia

No escuro desperto, assim me acontece
De mim nada perto, você adormece
Penso intrigada, será que me esquece?

Me canso, anoiteço, repleta de plano
O dia tem seu peso, bem sei não te engano
Me sinto acanhada, então nem te chamo

Me lembro do beijo, lá dentro de um sonho
Já faz algum tempo, lembrar me disponho
Sei que nem é cedo, mas vou te mandar

Pensando contente, talvez de mim lembre
Sonhando acordada, vez em quando ou sempre
Tão logo amanheço e enfim vou contar.

Florzinha Miudinha

Flor de Pitanga miudinha
Tão grande coração, branquinha
Se o ar me escapa lá de dentro
A flor se faz brotar no centro
 
Flor de Pitanga pequenina
Oferecendo mel no fruto ácido
Do amor tão renegado e plácido
Vida que segue da menina
 
Flor de Pitanga em tinta branca
Ver de vermelha e amarela encanta
O sabor da cura na garganta
Risca do peito a agonia
 
Pinta sem pressa a utopia
Fala de escuta na amargura
Sorri Pitanga tão madura
A flor miúda da alegria.

Poema inspirado no ponto cantado de umbanda “pedrinha miudinha”

Descrição Experimental da Voz

Sai da boca generosa de um tom avermelhado
E no lábio de baixo, ao centro, um fino e vertical traço
A voz que vibra junto com o ar que é abraçado
Na garganta quando escapa lá do pulmão apressado

Sua voz é meio ligeira, muito quente, prateada
É segura, espontânea, ri, desprende a risada
Vai falando e a voz acende, tal qual uma luz transparente
O que sente, envolvente, pele, músculo, língua e dente

Uma canção rompe o peito e pode até ser fervente
Deixando uma voz quase trêmula, cantando timidamente
Se articula, dentes, língua, um som úmido, acolhedor
Vem com tanta energia que me soa animador

Sai de águas tão profundas em ondas de querer bem
Surpreende em aconchego essa voz que vai além
Dá vontade de ouvir, de lembrar, não ficar sem
Fecho os olhos pra escutar, forte voz que a Ira tem!

Lágrimas de Bananeira

Quem compra banana devia saber
A dor que é ver bananeira chorar
O som que dá pra ouvir
E até lágrima espirrar
Do corte que o facão dá

Quem descasca banana devia saber
Quando ela é grossa e alta
O quanto tem que bater
E vê-la resistir
Até em pé cair

Quem mastiga banana devia pensar
Que lá de cima pássaros se vão
Ao ver embaixo o facão
Seu alimento tirar

Quem engole banana tem que saber
Depois do cacho arrancado
Com as frutas despencadas
No chão ela fica a morrer

Quem compra, descasca, mastiga, engole
O choro, o cheiro, sabor, maciez
Devia nunca esquecer
A dor, o pesar
E o trabalho que dá!

Espuma

Somos feitas de água
Água, imensidão
Feito medo, vazio
Nós não!

Pés firmados na areia
Lugar pra escolher nascer
Correr, fugir da espuma
Feito menina crescer...

Uma pausa incomoda
Um respiro querem arrancar
Da terra tirar pedaço
Salgar

Nós não, somos feitas de água
Doce amargo frutificar
Um corpo só é vazio
Mais água não há.